Confira a coluna do professor e advogado Leandro Sanson
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| Foto: Divulgação | 
Alagoinhas, essa nossa cidade que por inúmeras vezes foi palco de debates vibrantes, parece ter desenvolvido uma súbita alergia a microfones desafinados com o tom oficial.
Nada grave, apenas aquela velha
coceira autoritária que, de tempos em tempos, leva o poder público a confundir
governo com gestão de reputação. E, quando a crítica aperta, há sempre um
antídoto à mão: pressionar meios de comunicação, sugerir “ajustes” na
programação, cortar verbas publicitárias e, se nada disso surtir efeito, pedir
a cabeça do comunicador que insiste ousar em pensar alto.
O recente episódio da saída do
comunicador Adelson Filho da Rádio 93 FM, amplamente comentado na cidade, foi
lido por muitos como sintoma desse ambiente. Segundo relatos e manifestações
públicas, críticas direcionadas à gestão municipal teriam desagradado e, como
num roteiro conhecido, seguiu-se a dança das cadeiras. 
Aliás, o próprio Adelson Filho em
seu último comunicado na referida rádio bradou nos microfones que estava sendo “vítima
de perseguição política”, tanto por parte do Governo do prefeito atual
(Gustavo Carmo), bem como do anterior (Joaquim Neto).
Se houve ou não pressão direta do
poder público, cabe apurar com rigor. Mas o fato é inescapável: quando um
profissional de rádio cai no meio de críticas à administração, a percepção
social não é de mera coincidência; é de clima de intimidação. E clima, como se
sabe, também é política pública — pode ser saudável, mas também pode ser
tóxico.
O ponto não é personalizar a
polêmica, mas sim reconhecer o efeito pedagógico do gesto (diga-se de passagem,
nefasto ao interesse público). Desligamentos em contexto de crítica pública
possuem uma didática perversa: não calamos apenas uma voz, mas sim informamos
às demais qual é o preço do desacordo. O resultado é previsível: autocensura,
pauta tímida, jornalismo mais preocupado com humor do paço municipal do que com
o interesse do ouvinte. Uma delícia para quem governa, um desastre para quem
é governado.
Deixo claro, que não estou aqui
advogando salvo-conduto para erros jornalísticos. Há correções, há direito de
resposta, há responsabilização posterior. O que não há — e nem pode haver — é
linha direta entre Gabinete e estúdio para decidir quem fala e quem se cala. Se
esse cordão umbilical existe, ele precisa ser cortado à luz do dia.
Numa democracia adulta, o
microfone não é uma ameaça, mas sim um serviço público informal. Se causa
desconforto, é porque está funcionando.
Por vezes é importante relembrarmos o óbvio: A imprensa
livre não é um capricho, mas sim infraestrutura importante da democracia. E não
é preciso reinventar a roda, pois a nossa Constituição Federal de 1988 resolveu
essa equação com clareza:
- Art. 5º, IV: é livre a manifestação do
     pensamento.
- Art. 5º, IX: é livre a expressão da atividade de
     comunicação, independentemente de censura ou licença.
- Art. 220, caput: a manifestação do pensamento e
     a informação, “sob qualquer forma, processo ou veículo”, não sofrerão
     restrições, observada a própria Constituição.
- Art. 220, § 2º: é vedada “toda e qualquer
     censura de natureza política, ideológica e artística”.
O próprio STF, ao julgar a ADPF
nº 130 (Rel. Min. Ayres Britto, j. 30.4.2009), ao sepultar a antiga Lei de
Imprensa, afirmou, sem rodeios, que “o exercício concreto da liberdade de
imprensa assegura ao jornalista o direito de expender críticas a qualquer pessoa,
ainda que em tom áspero ou contundente, especialmente contra as autoridades e
os agentes do Estado.”
A história brasileira conhece bem
a “censura econômica”: não se precisa de tesoura para amputar o contraditório,
pois basta asfixiar financeiramente quem o sustenta. Quando a pauta
publicitária oficial vira moeda de chantagem para moldar conteúdo editorial, o
que se instala é uma espécie de “censura de luvas”, ou seja, polida no
protocolo, ferina no efeito. 
Aliás, a depender da situação, também
pode-se caracterizar em um problema de improbidade administrativa, pois a
publicidade estatal deve atender ao interesse público (art. 37, § 1º da
CRFB/1988), jamais à blindagem de imagem de governantes. Publicidade oficial
serve para informar a cidadania, não para premiar aliados e punir críticos. Quando
a régua publicitária mede afeto político, a linha da legalidade está, no
mínimo, borrada.
Não podemos normalizar episódios
como estes! Precisamos urgentemente levantar o debate público acerca de uma
Lei Municipal de Publicidade dos órgãos públicos da cidade. Somente
institucionalizando por lei critérios claros e objetivos para aplicação de
verbas de publicidade do Executivo e Legislativo Municipal é que poderemos vislumbrar
alguma esperança de termos uma imprensa livre (independente quem seja o Gestor
do momento).
Transparência não é gentileza, é obrigação! Democracia
gosta de luz. E luz, em regra, desestimula quem age nas sombras.
Alagoinhas não precisa de menos
crítica, mas sim precisa de mais maturidade institucional para suportá-la e,
melhor ainda, para dialogar com ela. Governos passam, mas o direito de falar
fica. E quando um microfone cai por desagrado oficial, o barulho que se ouve
não é o silêncio confortável do poder, mas sim o alarme da cidadania.
Se a Gestão ama o silêncio, há
bibliotecas! No rádio, sites e na imprensa, espera-se pluralidade, fricção e o
direito inalienável de dizer o que o poder pode ou não gostar de ouvir.
Leandro Carvalho Sanson é professor, advogado, coordenador acadêmico, ativista político filiado ao Novo e escreve para o Portal Pereira News.
