Desafios e Contradições na Gestão Municipal de Alagoinhas: Um Equilíbrio Delicado - Por Leandro Sanson

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Foto: Leandro Sanson


       “E agora, José? A festa acabou, a luz apagou, o povo sumiu, a noite esfriou, e agora, José?”  

                                                                                                 (Carlos Drummond de Andrade)


O poema “José”, de Carlos Drummond de Andrade, foi publicado originalmente em 1942, buscando ilustrar o sentimento de solidão e abandono do indivíduo na cidade grande, a sua falta de esperança e a sensação de que está perdido na vida, sem saber que caminho tomar. Sentimento esse que, aparentemente, pode ser facilmente traduzido e percebido no início do governo do Prefeito eleito Gustavo Carmo, em Alagoinhas-BA.

Já se passaram 100 dias de governo, marca que geralmente é tida como parâmetro para avaliar os avanços iniciais de uma nova gestão e o novo ritmo empregado, mas, em Alagoinhas, aparentemente tal marca não tem sido digna de nota por parte da imprensa e da população local.  

No início de sua gestão, o prefeito Gustavo Carmo enfrenta um cenário repleto de desafios e contradições. Eleito com o apoio de um amplo arco de partidos e grupos aliados, o Prefeito se vê agora na difícil tarefa de conciliar os interesses políticos de seus aliados com as crescentes demandas da população alagoinhense.

A vitória nas urnas, que parecia promissora, trouxe à tona uma realidade complexa e dura, mas já por muitos sabida, só não convenientemente comentada, pois, afinal, o vale-tudo eleitoral sobrepõe a lógica de “gestão”. O prefeito, que se comprometeu a promover mudanças significativas na cidade, agora precisa lidar com a pressão de um grupo diversificado de partidos que esperam retorno político por seu apoio. Essa situação gera um dilema: como atender às expectativas de seus aliados sem desviar o foco das necessidades da população? Certamente, não será fácil!

Um dos principais desafios enfrentados por Carmo é a questão da infraestrutura. O início turbulento do ano letivo nas escolas, com problemas de infraestrutura, algumas sem aulas, sem funcionários e professores suficientes para atender à demanda, demonstrou uma grande falta de organização e planejamento da Secretaria Municipal de Educação, que, diga-se de passagem, deveria ser diferente, pois são problemas que se arrastam desde o governo anterior, no qual o próprio prefeito foi secretário da pasta.

Somado a isso, a problemática do dito “elefante branco” do Viaduto da Rua do Catu segue sem resolução, gerando inúmeros debates públicos, inclusive na Câmara de Vereadores, aumentando as crescentes críticas da população, que reverberam quase que diariamente nos veículos de imprensa locais.

Como se não fosse suficiente, mais recentemente circulou a denúncia da colocação de novos postes da rede de energia acima da ciclovia da Av. Murilo Cavalcanti (antiga Paulo Afonso), praticamente inviabilizando seu uso para o ciclismo e prejudicando para caminhada. Tais situações e atropelos da Administração Municipal nesse início de governo, além das naturais críticas, têm sido inclusive objeto de humor nas redes sociais, onde interlocutores passaram a dizer que “Alagoinhas é o único município onde tem viaduto que não passa carro, ciclovia que não passa bicicletas e Prefeitura que não tem administração”, aumentando a já evidente pressão sobre o Prefeito.

Nesse contexto, naturalmente os moradores de Alagoinhas clamam por melhorias nas ruas, saneamento básico, saúde, educação, transporte público, e inclusive pela conclusão das inúmeras obras inacabadas deixadas pelo seu padrinho político e ex-prefeito Joaquim Neto.

No entanto, a alocação de recursos e a definição de prioridades se tornam complicadas quando interesses partidários entram em cena. A necessidade de atender a demandas urgentes pode ser ofuscada por promessas feitas durante a campanha, que, muitas vezes, envolvem projetos que beneficiam grupos específicos.

Contradições entre Promessas de Campanha e Início de Governo

Na busca de tentar se firmar como um “candidato diferente”, na época da campanha Gustavo Carmo assumiu inúmeros compromissos públicos, dentre os quais o de que, se fosse eleito, não iria criar novos cargos comissionados (compromisso assumido em sabatina da Rádio 93 FM), bem como, buscando se afastar das críticas na época, o de não nomear parentes na Prefeitura (compromisso inclusive afirmado também em entrevista nesse próprio site – Pereira News).

No entanto, a realidade pós-eleição foi outra. Logo no início de seu governo, o Prefeito encaminhou para a Câmara de Vereadores uma reforma administrativa na qual criava mais de 100 (cem) cargos novos (Lei Complementar nº 181/2025), gerando um impacto financeiro anual aos cofres públicos em torno de R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais).

Por outro lado, as surpresas não pararam. Nos cem primeiros dias de governo, o Prefeito Gustavo Carmo nomeou a sua esposa (Sra. Lianne Araújo Carmo) como Secretária de Planejamento e Captação de Recursos, bem como também vários primos para cargos diversos na Administração Municipal. Apesar de, em tese, tais nomeações não serem ilegais, são, no mínimo, imorais, servindo como prato cheio para as críticas advindas dos grupos de oposição.

É como diz o provérbio português: “tudo como dantes no quartel de Abrantes”.

Na política, assim como na economia, toda escolha gera um custo (sacrifício) de algo, para aproveitar a oportunidade escolhida (custo de oportunidade). Ao apostar em uma ampla e pragmática aliança entre grupos diversificados e divergentes em torno do objetivo da esperada vitória eleitoral, Gustavo Carmo evidentemente sacrificou a possibilidade da implementação de uma política de liberdade de gestão e visão de governo.

A estratégia, a curto prazo, deu certo, proporcionando uma vitória em uma eleição extremamente difícil. O problema é que, após a lua de mel, veio a cobrança das faturas por parte de seus aliados (pelo que se fala nos bastidores, de apetites vorazes). No entanto, essa estratégia requer habilidade e paciência, pois a insatisfação popular pode se manifestar rapidamente, especialmente em tempos de crises e grandes expectativas.

Enquanto o desânimo da população cresce, o Prefeito e sua equipe de governo, aparentemente, parecem não ter saído ainda do palanque eleitoral, focando no uso de narrativas e jargões nas entrevistas, e no uso midiático em redes sociais. O problema é que, passados já mais de cem dias de governo, a população vai gradualmente se cansando do falatório sem efetivos resultados.

Em suma, o início da gestão de Gustavo Carmo é marcado por um delicado equilíbrio entre política e administração pública. As dificuldades e contradições que surgem nesse processo são um reflexo da complexidade da governança em um município que anseia por mudanças reais e significativas, em contrapartida de um sistema político baseado no “toma lá, dá cá”.

O futuro de Alagoinhas dependerá da habilidade do prefeito em transformar esses desafios em oportunidades de crescimento e desenvolvimento para todos. Tarefa difícil que só o tempo dirá o que será!

Enquanto isso, por ora, nós do POVO só nos resta a fatídica pergunta:  “E AGORA, JOSÉ?”


Leandro Carvalho Sanson é professor, advogado, coordenador acadêmico, ativista político filiado ao Novo e escreve para o Portal Pereira News.

1 Comentários

  1. Excelente análise. Coerência e verdade para quem deseja entender a realidade da cidade. Parabéns futuro prefeito.

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